Reflexões no Livro de Êxodo
de Severino
Gomes do Nascimento
Entre os capítulos 32 e 34 do livro de
Êxodo encontra-se uma seqüência de eventos que mudou o curso da história do
povo de Israel após sua saída do Egito. Estes eventos da segunda parte de Êxodo
mudaram o caráter do povo e sua visão de Deus e relacionamento com Deus. Em
meio a estes eventos, há uma grande revelação, quando o texto atinge seu
clímax!
Tudo
começou com a impaciência do povo esperando pela descida de Moisés do Monte
Sinai em capítulo 32. Enquanto Moisés
estava lá em cima pegando as leis, o povo, que demonstrou ser muito volúvel,
desviou-se a procura de um deus qualquer que os guiasse pelo deserto (Êxodo
32:1-6). Em vista de tamanha ingratidão do povo mergulhado em perversão, a
reação de Deus foi de ira. Ele quis destruir todo aquele povo mal, de dura
cerviz, e começar tudo novo com Moisés, assim como Ele fez com Noé em Gênesis 9
(Êx 32:7-10). Em meio a ira ardente de Deus, Moisés corajosamente intercede e
apela a Deus para que Ele mude de propósito e não destrua o povo. Para isto
Moisés usa de dois argumentos, e Deus atende o pedido, mostrando aqui parte de
Seu caráter flexível. (32:11-14).
“Então o Senhor se
arrependeu do mal
que dissera que havia
de fazer ao seu povo.” (Êx 32:14)
Acredito
que Moisés agiu de bom coração a favor do seu povo, mas inconsciente da
gravidade do problema que estava acontecendo lá em baixo. A reação dele quando
desceu é espantosa! Primeiro ele confronta o povo (32:19-20), depois ele
questiona Aarão, que ao que parece, começa a dar desculpas (32:21-24). Por fim,
Moisés junto com os levitas extermina três mil dos que participaram da adoração
do bezerro de ouro (32:25-29) e depois repreende o restante do povo e volta a
consultar o Senhor (32:30-34). Em 33:1-11, parece que há uma mudança de
estratégia: a tenda da presença do Senhor é movida para fora do acampamento do
povo. Estaria Deus se afastando do seu povo?
Neste ponto da história, Moisés
perde a segurança de que se o Senhor iria continuar com este povo tão rebelde.
Imagino que Moisés não teria mais desejo e ânimo para continuar esta jornada de
uma vida, conduzindo um povo duro, sem que o Eterno Deus estivesse ao seu lado.
Em 33:12-16, Moisés faz um pedido um tanto quanto ousado; seu pedido é uma
expressão de alguém que está buscando segurança.
“Se eu, pois, tenho achado graça aos teus olhos, rogo-te que agora me mostres os teus caminhos, para que eu te
conheça, a fim de que ache graça aos teus olhos;
e considera que esta nação é teu povo.” (Êx 33:13)
Moisés que gozava do privilégio de
uma profunda comunhão com Deus (“E falava o Senhor a Moisés face a face, como
qualquer fala com o seu amigo.” 33:11), não se deu por satisfeito e faz um dos
pedidos mais ousados da sua vida: “Rogo-te
que me mostres a tua glória.” (Ex 33:18). É interessante que Deus diz que
não há ser vivo que possa ver a Sua glória e viver, logo, já que Moisés é tão
importante para o futuro da nação, Deus atende pela segunda vez o seu pedido,
mas em parte. Mais é aí que o texto atinge o seu clímax. Deus mostra parte de
sua glória a Moisés, mas muito mais que glória. Moisés ouve uma das mais
completas declarações nas Escrituras sobre quem é Deus. Algo semelhante a
Isaías 6:3 e João 4:24!
“Iahweh! Iahweh...
Deus de compaixão e de piedade, lento para a cólera e cheio de amor e
fidelidade; que guarda o seu amor a milhares, tolera a falta, a transgressão e
o pecado, mas a ninguém deixa impune e castiga a falta dos pais nos filhos e
nos filhos dos seus filhos, até a terceira e quarta geração.
Imediatamente Moisés caiu de joelhos por terra e adorou;” (Êx 34:6a-8 BJ).
Note a reação de reverência de
Moisés diante da presença da glória de Deus. Mas note também o conteúdo das
palavras. A primeira parte da declaração (ou credo) proclama o caráter de amor
do Deus do Velho Testamento. É com base neste caráter que Deus assegura o
terceiro pedido de Moisés: “vá o Senhor
no meio de nós.” (Êx 34:9). Estamos falando aqui de um povo rebelde,
reclamão e que havia passado mais de 400 anos em meio aos hábitos e idolatrias
do Egito. Todavia, Deus assegura o
pedido de Moisés, renovando a Aliança com o povo (34:10). Os capítulos
seguintes (35 – 40:33) contém detalhes técnicos sobre a construção do
tabernáculo, este tabernáculo agora ficaria centrado exatamente no meio do
acampamento do povo. É Deus assegurando o pedido de Moisés e o bem-estar de seu
povo (Cf. Levítico!).
Seria injusto não notar que a
segunda parte da declaração é acerca do caráter justo de Deus com relação ao
pecador. Deus é amor, mas Ele também é justiça. As duas partes estão presentes
na proclamação de Êxodo 34:6a-8. Mas observando o desenvolver desta história,
torna-se notório como Deus age muito mais pelo seu amor, do que pela sua
justiça. Enganam-se aqueles que pensam que o Deus do Velho Testamento é somente
justiça e ira. Mas enganam-se também aqueles que pensando que Deus só é amor.
Sem dúvida o seu amor prevalece, mas a sua justiça está presente.
Após todos os detalhes técnicos do
tabernáculo, o livro de Êxodo termina com um versículo descrevendo a presença
do SENHOR com seu povo. Mas são as últimas palavras do último versículo de
Êxodo que chamam atenção, pois voltam a refletir o terceiro e último pedido de
Moisés. Estas últimas palavras também refletem o intenso amor do Deus do livro
de Êxodo.
“Porquanto a nuvem do Senhor estava de dia sobre o tabernáculo,
e o fogo estava de noite sobre ele,
perante os olhos de toda a casa de Israel,
em todas as suas jornadas.”
(Êxodo 40:38)
QDBV